Destinação da Terra Os Espíritos
explicam, no capítulo terceiro da primeira parte de O Evangelho Segundo o
Espiritismo: “A qualificação de mundos inferiores e mundos superiores é antes
relativa que absoluta. Um mundo é inferior ou superior em relação aos que estão
abaixo ou acima dele, na escala progressiva.” A medida cósmica é a evolução.
“Embaixo” e “em cima” são expressões graduais, e não locais. A terra já foi um
mundo inferior, quando habitado pela humanidade primitiva que nela se
desenvolveu. O seu progresso foi ainda incentivado por migrações de espíritos,
realizadas em massa, no momento em que um mundo distante conseguiu subir na
escala dos mundos. Seus “resíduos evolutivos” foram então transferidos para o
nosso planeta. Criaturas superiores aos habitantes terrenos, exilados na Terra,
deram-lhe extraordinário impulso evolutivo. Assim, ela passou de mundo
primitivo para a categoria de mundo de expiações e provas. Essa é a condição
atual da Terra. Mas é, também, a condição que ela está prestes a deixar, a fim
de elevar-se à categoria de mundo de regeneração. Vejamos, porém, como explicar
o nosso estágio atual. Ensina O Evangelho Segundo o Espiritismo, no capítulo
citado: “A superioridade da inteligência de um grande número de habitantes
indica que ela não é um mundo primitivo, destinado à encarnação de Espíritos
ainda saídos das mãos do Criador. As qualidades inatas que eles revelam são a
prova de que já viveram, e de que realizaram algum progresso. Mas também os
numerosos vícios a que se inclinam são o índice de uma grande imperfeição
moral. Eis porque Deus os colocou numa terra ingrata, para aí expiarem as suas
faltas, através de um trabalho penoso e das misérias da vida, até que mereçam
passar para um mundo mais feliz.” Ao mesmo tempo, Espíritos ainda na infância
evolutiva, e Espíritos de um grau intermediário, mesclam-se às coletividades em
expiação. Representamos uma mistura de exilados e população aborígine. Os
antigos habitantes do mundo primitivo convivem com os imigrantes civilizadores.
Mas estes mesmos civilizadores ainda são bastante imperfeitos, e realizam sua
missão expiando as faltas cometidas em outros mundos. A explicação prossegue:
“A Terra nos oferece, portanto, um dos tipos de mundos expiatórios, de que as
variações são infinitas mas que têm por caráter comum o de servirem de lugar de
exílio para os Espíritos rebeldes à lei de Deus. Nesses mundos, os Espíritos
têm de lutar ao mesmo tempo com a perversidade dos homens e contra a
inclemência da natureza, duplo e penoso trabalho, que desenvolve
simultaneamente as qualidades do coração e as da inteligência. É assim que
Deus, na sua bondade, transforma o próprio castigo em proveito do progresso do
Espírito.” Esta bela comunicação é assinada por Santo Agostinho, que usa o
título de santo para fins de identificação. A seguir, com a mesma assinatura,
temos uma mensagem sobre a condição do mundo em que o nosso planeta se
transformara: o mundo de regeneração. Estes mundos, explica o Espírito: “servem
de transição entre os mundos de expiação e os mundos felizes”. São, portanto,
simples escalas de aperfeiçoamento, na cadeia universal dos mundos. Prossegue a
informação espiritual: “Nesses mundos, sem dúvida o homem está ainda sujeito às
leis que regem a matéria. A humanidade experimenta as vossas sensações e os
vossos desejos, mas livre das paixões desordenadas que vos escravizam.” Estas
frases traduzem uma bem-aventurança com que há muito sonhamos: “A palavra amor
está gravada em todas as frontes; uma perfeita equidade regula as relações
sociais.” Não estamos diante de uma humanidade perfeita, mas apenas de um grau
de evolução superior ao nosso. O homem ainda é falível, sujeito a se deixar
levar por resíduos do passado, arriscando-se a cair de novo em mundos
expiatórios para enfrentar provas terríveis. Quem não verifica o realismo desta
descrição, comparando o nosso desenvolvimento atual com o nosso passado, e
verificando as diretrizes do progresso terreno? Os Espíritos não anunciam uma
transição miraculosa, mas uma transformação progressiva do mundo, que já está
em plena realização. Nosso mundo de regeneração será mais ou menos feliz,
segundo a nossa capacidade de construí-lo. O homem terreno atingiu o grau
evolutivo que lhe permite responder plenamente pelas suas ações. Deus respeita
o seu livre-arbítrio, para que ele possa aumentar a sua responsabilidade. No
mesmo capítulo citado, e com a mesma assinatura espiritual, encontramos ainda
estes esclarecimentos. “Acompanhando o progresso moral dos seres vivos, os
mundos por eles habitados progridem materialmente. Quem pudesse seguir um mundo
em suas diversas fases, desde o instante em que se aglomeraram os primeiros
átomos da sua constituição, vê-lo-ia percorrer uma escala incessantemente
progressiva, mas através de graus insensíveis para cada geração, e oferecer aos
seus habitantes uma morada mais agradável, à medida que eles mesmos avançam na
via do progresso. Assim marcham paralelamente o progresso do homem, o dos
animais seus auxiliares, dos vegetais e das habitações, porque nada é
estacionário na natureza. Quanto esta ideia é grande e digna do Criador! E
quanto, ao contrário, é pequena e indigna de seu poder, a que concentra a sua
solicitude e a sua providência sobre o imperceptível grão de areia da Terra e
restringe a humanidade aos poucos homens que a habitam!” Esta concepção cósmica
não é grandiosa apenas no seu aspecto exterior, mas também e principalmente no
seu sentido subjetivo e, portanto, profundo. O que mais se afirma, em toda a
sua extensão, é o princípio de liberdade e de responsabilidade humanas. Os
Espíritos, que são as criaturas humanas, encarnadas ou não, apare-cem como os
artífices do seu próprio destino pessoal e coletivo, e como os demiurgos
platônicos que modelam os mundos. Deus lhes oferece a matéria-prima das
construções, mas são eles os que constroem, com inteira liberdade dentro das
limitações naturais das condições de vida em cada plano cometendo crimes ou
praticando atos de justiça, bondade e heroísmo, para colherem os resultados de
suas próprias ações. O sentido ético dessa concepção é revolucionário. Deus não
está, diante dela, em nenhuma das duas posições clássicas do pensamento
filosófico e religioso: nem como o Ato Puro de Aristóteles, indiferente ao
Mundo, nem como o Jeová humaníssimo da Bíblia, comandando exércitos e dirigindo
as ações humanas. Só mesmo a síntese cristã do Deus Pai, velando paternalmente
pelos filhos, corresponde à sua grandeza. E é justamente essa síntese que se
corporifica na ideia de Deus da concepção espírita. Mas, como até hoje, o Deus
Pai do Cristianismo não se efetivou entre os homens, o Espiritismo o apresenta
em novas dimensões, promovendo a sua revolução ética no mundo em transição.
Herculano Pires do livro O Espírito e o Tempo.
De Renato Ramos Filho Ramos
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